Mateus Solano encara o desafio de interpretar gêmeos e driblar o rótulo de galã da novela
RIO - "Cadê o outro?", pergunta a menina de vestido rosa e tiara verde-limão a Mateus Solano, durante um ensaio fotográfico em Parada de Lucas, subúrbio do Rio. Simpático, o ator tenta disfarçar: "Não posso contar, é segredo profissional". A criançada da comunidade fica ainda mais curiosa, de olhar ressabiado. Mas, é bom deixar claro, não são só os pequenos que chegaram a acreditar que dois atores interpretam os gêmeos Jorge e Miguel em "Viver a vida". Tem muito marmanjo por aí que já se confundiu vendo as cenas do folhetim de Manoel Carlos.
- Eu tenho a grande vantagem, não desmerecendo o meu trabalho nem o de ninguém, de não ter o rosto conhecido. Se eu fosse famoso, seria "O" Mateus Solano fazendo o Jorge e o Miguel. Se o Fábio Assunção faz gêmeos, por exemplo, todo mundo já conhece todos os ângulos do rosto dele. O fato de não me conhecerem é muito bacana, pois posso me encaixar em lacunas das pessoas - analisa Mateus. - Já disseram que o Miguel é mais bonito do que o Jorge... Me falaram também que um é melhor ator do que o outro - diverte-se.
O ator, de 28 anos e "carinha de 30", como se autozomba, também usa o fato de ser novato na televisão - no teatro já são 12 anos e mais de 20 peças - como justificativa para, na época da minissérie "Maysa - Quando fala o coração", seu primeiro trabalho de destaque na TV, ter ouvido de tanta gente que estava muito parecido com o seu personagem, o sedutor Ronaldo Bôscoli.
- Amigos do próprio compositor vieram falar que eu estava com os trejeitos do Bôscoli. Não peguei trejeito nenhum. Entendi mais ou menos o personagem e fui. O que acontece é que as pessoas sentem saudades, querem ver o Bôscoli e, por isso, encaixam as coisas que proponho em cena - explica.
O fato é que Mateus agradou. E foi durante a exibição da minissérie que ele recebeu o convite de Maneco e do diretor Jayme Monjardim, a mesma dupla de "Maysa", para viver o duplo galã na novela das 20h.
- Recebi o convite em janeiro, mas só soube que faria gêmeos em maio, um mês antes de irmos gravar em Paris. No primeiro momento, entrei em choque. Me deu um nervosismo criativo! Entendo que nervosismo é importante para o trabalho, mas eu estava além da conta. Primeira novela, dois protagonistas, Manoel Carlos... - enumera.
Agora Mateus está mais calmo. Só a história de ser considerado "galã" é que (ainda) o tira do sério.
- Ninguém vai me convencer de que eu virei galã. Galãs são o Jorge e o Miguel. Os personagens é que são jovens, bonitos e protagonistas. Se me chamarem para fazer um louco, como vai ser? Vou ser um galã louco? Um galã travesti? Quero ser tudo - esbraveja.
Mateus que nos desculpe, mas até Antônio Breves, o seu primeiro professor de teatro, na Escola Parque, sabe que o seu pupilo tem talento para ser bonitão.
- Ele detesta ser chamado de galã, mas não tem jeito, ainda mais porque galã está em falta no mercado. Ele é o cara do momento - afirma.
Os ensinamentos de Breves, a arte do improviso que aprendeu no Tablado e a formação na UniRio são bem explorados por Mateus na hora de incorporar os gêmeos em cena. Raros são os dias em que o ator interpreta apenas um dos irmãos. Normalmente, a rotina é pesada e ele precisa mudar detalhes da personalidade de acordo com o personagem em questão de minutos. Figurino e cabelo ajudam, é claro, mas 90% cabem ao ator - que conta com a ajuda e com o corpinho do dublê Gabriel Delfino.
Mateus faz questão de dizer que não tem um gêmeo predileto. Seu amor pelos filhos de Ingrid (Natália do Vale) e Leandro (Nelson Baskerville) é totalmente igual e incondicional. Sua "namorida", a atriz Paula Braum, também defende as duas versões do seu amado, mas deixa escapar uma certa preferência por Jorge.
- O Miguel é mais carismático. Mas o Jorge é supersensível, se esconde atrás dos próprios medos - opina Paula, que vê um pouquinho de Mateus em cada um dos gêmeos. - O Mateus parece muito com o Miguel quando ele está brincando entre amigos. Já o Jorge lembra o Mateus quando ele está estudando e na questão dos objetivos de vida.
Se no início da novela os irmãos brigavam como cão e gato, nos próximos capítulos a dupla vai ficar mais unida por conta do acidente de Luciana (Alinne Moraes) - a namorada de Jorge e futura mulher de Miguel. Em um ato comovente, o arquiteto agradecerá ao médico por sua atuação na cirurgia de Luciana. Mas a trégua será curta.
" Se é para viver um personagem, vivo o Mateus, que já é bem complicado "
- Torço pelos dois - diz Mateus, que prefere não se comparar com os personagens. - Se é para viver um personagem, vivo o Mateus, que já é bem complicado.
Essa história pode ser até complicada, mas também promete ter final feliz. Quem diz é Manoel Carlos.
- O Mateus já nasceu protagonista. Está fazendo uma carreira muito bem alicerçada em inteligência, cultura e visão correta do que seja um ator. Não se encanta em ser celebridade. Fazendo o Bôscoli, ele provou que podia criar um personagem real na ficção, com um distanciamento que só com muito talento se pode alcançar. O Mateus já tem um lugar de destaque na televisão brasileira. Salve ele!